
O STF contraria a Constituição da República ao não divulgar as informações sobre viagem dos seus ministros, como despesas, motivo e destinos. Divulga apenas as informações sobre as diárias. Em 2024. As diárias do presidente e comitivas somaram R$ 520 mil. Além dessa falta de transparência, o STF completou cinco anos sem prestar contas ao TCU.
A Constituição diz que “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral”. Mas acrescenta que estão ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. O STF usa essa brecha afirmando que, “por razões de segurança, as informações relativas à emissão de passagens para ministros conterão apenas o valor da despesa mensal, de forma individualizada. Essas medidas são necessárias para garantir a segurança e a integridade física dos servidores e das autoridades protegidas”, diz o STF na sua página de “transparência”.
O tribunal acrescentou que, “pelo mesmo motivo, as informações sobre deslocamentos de segurança são protegidas e não são divulgadas. No entanto, o Tribunal divulga mensalmente o total dos gastos com diárias relacionadas à segurança. Essas medidas são necessárias para garantir a segurança e a integridade física dos servidores e das autoridades protegidas”. Até mesmo as viagens nacionais dos ministros em jatinhos da FAB estão sob sigilo. Lembrando que os gastos com viagens dos presidentes da República, na Câmara dos Deputados e do Senado estão detalhados nos seus Portais de Transparência.
“Achados” na última prestação de contas
O STF publicou o relatório de gestão de 2024, mas não está na relação de Unidades Prestadoras de Contas (UPC) para julgamento das contas, como informa o próprio tribunal. Isso vem acontecendo há cinco anos.
A última prestação de contas ocorreu em agosto de 2021. O Acórdão 9764/2021 do TCU aprovou a Prestação de Contas do STF relativa ao Exercício Financeiro de 2019. “Contas regulares, com quitação plena”, registrou o TCU. Na avaliação das contas de 2019, porém, foram apontadas alguns “achados”. Um deles foi relativo à qualidade dos controles internos de compras e contratações por dispensa de licitação. Os achados: deficiência quanto à comprovação dos requisitos exigidos pela hipótese legal de dispensa de licitação, deficiência na justificativa do preço a ser contratado mediante dispensa de licitação e descumprimento de cláusula contratual por parte da contratada.
Mas o acórdão ressaltou que “a auditoria ainda estava em andamento, e o relatório preliminar de fiscalização em fase final de elaboração, para que fosse submetido à Secretaria do Tribunal o quanto antes, de modo que não há nenhuma ação do TCU que deva ser implementada”. A prestação de contas foi arquivada e não houve mais julgamento de contas do STF.
Na avaliação dos serviços de ouvidoria e de atendimento à Lei de Acesso à Informação (LAI), foram identificados os seguintes riscos: 1) à imagem do STF perante à sociedade, por não apresentar uma unidade de ouvidoria aderente aos padrões e às boas práticas; 2) à qualidade dos serviços prestados pelo STF, por falta de implementação de requisitos estruturantes para Central do Cidadão/ouvidoria; 3) à imagem do STF perante seus usuários, decorrentes de divulgação de informações imprecisas, na forma e no conteúdo; entre outros riscos.
Em 2019, o STF divulgava, em planilha eletrônica, dados sobre diárias e passagens aéreas (nacionais e internacionais) concedidas a ministros, servidores e colaboradores. As informações continham o nome do magistrado/servidor/colaborador, detalhes como cargo, motivo da viagem, data da viagem, trecho voado, quantidade de diárias e custo efetivo. Em cinco anos, houve um enorme retrocesso.
Atualmente, os dados sobre diárias e passagens estão no Portal de Transparência do STF, escondidos em “dados sobre auxílios e indenizações”. As informações sobre as diárias internacionais, em planilha no formato PDF, chegam até o final de 2024. As despesas do presidente Roberto Barroso e integrantes das comitivas somaram R$ 520 mil.
Os dados sobre passagens aéreas nacionais e internacionais vão até 2023. Em planilha no formato PDF, constam o nome do servidor, cargo, lotação, data, trecho e custo. As viagens dos ministros estão no final da planilha. São todas viagens de “representação institucional”. Sete ministros gastaram R$ 340 mil. As maiores de despesas foram de Luiz Fux (R$ 95 mil), Dias Toffoli (R$ 69 mil), André Mendonça (R$ 67 mil) e Gilmar Mendes (R$ 64 mil). Não há informação sobre possível evento, data, local, valor de cada viagem. Incluindo os voos dos servidores, as despesas com viagens chegaram a R$ 4,5 milhões em 2023, sendo R$ 2,9 milhões para “segurança institucional”.
Os dados sobre diárias de viagens internacionais vão até abril de 2024. Constam despesas de diárias no valor total de US$ 105 mil. As cinco viagens do presidente Roberto Barroso somaram US$ 16 mil. Somando com os gastos da comitiva, foram US$ 54 mil. Ele esteve em eventos oficiais em San José da Costa Rica, Davos e Zurique, Paris, Nova York e Boston e Canadá. As viagens de segurança institucional somaram US$ 37 mil.
A Lei de Acesso à Informação diz que é dever dos órgãos e entidades públicas promover, em local de fácil acesso, a divulgação de informações de interesse coletivo por eles produzidas ou custodiadas. Os órgãos e entidades públicas deverão utilizar todos os meios e instrumentos de que dispuserem, sendo obrigatória a divulgação em sítios oficiais da rede mundial de computadores (internet). Os sítios deverão atender aos seguintes requisitos: conter ferramenta de pesquisa de conteúdo que permita o acesso à informação de forma objetiva, transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão; possibilitar a gravação de relatórios em diversos formatos eletrônicos, tais como planilhas e texto, de modo a facilitar a análise das informações.
Questionado pelo blog, o TCU afirmou que, “desde 2010, por força das instruções normativas 63/2010, vigente até 2019, e 84/2020, vigente a partir de então, o TCU constitui processo e leva a julgamento apenas parte das contas que são apresentadas”.
O tribunal acrescentou que “os órgãos que terão processos de contas julgados em cada ano são definidos conforme critérios estabelecidos nas normas aprovadas pelo Plenário do Tribunal. Essa definição considera critérios como riscos envolvidos da gestão, materialidade, relevância e apontamentos de auditorias anteriores, entre outros”.
Segundo o TCU, “os órgãos e entidades que não têm processo de contas constituído e julgado em determinado exercício devem, obrigatoriamente, apresentar relatório de gestão ao Tribunal e publicá-lo em sua respectiva página na internet, para prestação de contas de acesso público. O fato de não ter processo de contas julgado não impede a fiscalização do TCU por meio de processos de auditorias, representações e denúncias, por exemplo”.