A Polícia Federal informou nesta quarta-feira (28) ter descoberto a existência de uma organização criminosa que fazia espionagem e cometia homicídios sob encomenda. O grupo, chamado de “Comando C4”, teria, inclusive, uma tabela de preços para monitoramento e execução de autoridades, como ministros do Supremo Tribunal Federal, segundo informou à Gazeta do Povo uma fonte com conhecimento do caso.
A investigação é um desdobramento da Operação Sisamnes, que apura um esquema de venda de sentenças envolvendo desembargadores e ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A 7ª fase da operação, deflagrada nesta quarta-feira, prendeu cinco suspeitos de serem mandantes e coautores do assassinato do advogado Roberto Zampieri, suspeito de participar no esquema de venda de sentenças. Também foram executados quatro mandados de monitoramento eletrônico e seis mandados de busca e apreensão nos estados de Mato Grosso, São Paulo e Minas Gerais.
O advogado Roberto Zampieri, de 57 anos, foi morto com 10 tiros dentro do próprio carro em frente ao seu escritório, em Cuiabá (MT), em 5 de dezembro de 2023. A ação foi registrada por uma câmera de segurança, que flagrou o momento em que um homem de boné efetuou os disparos contra o advogado.
Em março do ano passado, o delegado Nilson Farias, responsável pela investigação do assassinato do advogado, disse ter encontrado evidências de que Zampieri pode ter sido morto em decorrência de uma disputa de terras na justiça. Na ocasião, o delegado relatou a existência de uma demanda judicial envolvendo duas fazendas em Paranatinga, a 411 km de Cuiabá, avaliadas em cerca de R$ 100 milhões.
O principal suspeito de ser o mandante do crime estava disputando a posse da terra com outro fazendeiro representado por Zampieri. Segundo o delegado, o acusado de ser o mandante do crime desconfiava de uma suposta aproximação de Zampieri com o desembargador do caso.
VEJA TAMBÉM:
Investigação levou polícia a identificar grupo de extermínio
Em meio às investigações sobre o assassinato do advogado, a polícia encontrou evidências de um suposto grupo de extermínio envolvendo civis e militares da ativa e da reserva. A informação foi confirmada à Gazeta do Povo por fontes ligadas à Polícia Federal (PF).
Os presos na operação desta quarta-feira (28) teriam ligação com este grupo de extermínio, que seria o responsável pela execução do advogado Roberto Zampieri.
Além do fazendeiro acusado de ser o mandante do crime, são acusados de envolvimento no caso um instrutor de tiro, que seria o proprietário da pistola calibre 9 mm usada no assassinato, um coronel da reserva e um sargento reformado.
Acusado de ser o executor confessou o crime
O acusado de ser o executor dos disparos foi preso e indiciado após confessar o crime. Segundo apurou a Gazeta do Povo junto à PF, ele teria recebido R$ 40 mil pela execução. Para se aproximar da vítima, se passou por um capelão, utilizando uma boina e uma bengala.
Em depoimento, o homem revelou não ter arrependimentos e descreveu o homicídio como uma “merda malfeita”, atribuindo a falha à pressa dos mandantes. Relatou ainda que pretendia realizar o crime em local isolado para facilitar a fuga, mas não conseguiu.
Grupo tinha tabela de preços para monitoramento e execução de autoridades
Além disso, segundo uma fonte com conhecimento da investigação, o Comando C4 ofereceria serviços para monitorar autoridades, como ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), deputados, senadores e ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O grupo, segundo fontes da PF, teria até uma tabela de preços para monitoramento e assassinatos de autoridades. Os serviços poderiam chegar a R$ 250 mil no caso de assassinatos encomendados de ministros, mas o monitoramento variava com valores de R$ 50 mil, R$ 100 mil e R$ 150 mil.
No caso específico envolvendo compra de sentenças eles ofereceriam aos interessados algumas ações, como monitoramento e até intimidação de autoridades que não corroboravam com as vendas de sentenças, segundo a PF.
“Comando C4” era inspirado em organização paramilitar da ditadura
O nome “Comando C4” deriva de uma organização paramilitar chamado Comando de Caça a Comunistas, Corruptos e Criminosos, que atuou no período da ditadura militar, entre as décadas de 60 e 80. O objetivo era fortalecer lideranças para defender o regime da época.
O grupo, criado há cerca de 60 anos, teria se remodelado nos últimos anos e uma das suas ações mais recentes seria a oferta de monitoramento de autoridades.
PF teria encontrado agenda com nomes de ministros do STF e senador
Nas investigações, a Polícia Federal teria encontrado em uma agenda do grupo os nomes dos ministros do STF, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin, que é relator da ação que levou às prisões desta quarta-feira, segundo apuração do portal de notícias g1.
O nome do ex-presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também estaria anotado na agenda. No caso dos ministros do STF, as anotações não especificam o tipo de atividade que o Comando C4 pretendia realizar. Já no caso do senador Rodrigo Pacheco, haveria indicativo de monitoramento.
Em nota ao g1, Pacheco disse que os suspeitos, pelo que mostram os achados da PF, agiam como se o Brasil fosse uma terra sem lei.
O advogado-geral da União, Jorge Messias, também comentou o caso, afirmando que a notícia da desarticulação da organização “choca pela ousadia e pela insensatez.”
“Trata-se de absurdo sem precedentes no país, alimentado por discursos de ódio de quem não tem compromisso com a democracia. É fundamental reforçar a defesa do STF, de seus Ministros e garantir liberdade e segurança para o trabalho dos agentes públicos”, escreveu Jorge Messias em seu perfil no X, nesta quarta.
Investigação sobre morte do advogado levou à desarticulação de esquema de venda de sentenças
A investigação sobre morte do advogado também levou à desarticulação de um esquema de venda de sentenças envolvendo até ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ). No celular dele a polícia encontrou indícios de que ele seria membro ativo de uma organização que subornava juízes e desembargadores e negociava decisões judiciais.
O esquema funcionaria da seguinte forma: funcionários dos gabinetes dos juízes passariam eventuais minutas de votos para advogados e lobistas, que por sua vez entrariam em contato com as partes interessadas para negociar as sentenças.
Caso o valor fosse pago, a minuta seria transformada na decisão judicial oficial. Caso contrário, a decisão seria alterada em favor da parte oposta.
A investigação na Polícia Federal e no Supremo Tribunal Federal (STF) indica suspeitas de esquemas milionários de venda de sentenças envolvendo o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJ-MS) e servidores do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a segunda principal Corte do país.