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MST deixa de ser um aliado e se torna fonte de desgaste para Lula

Histórico parceiro do Partido dos Trabalhadores (PT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) deixou de ser um aliado estratégico e passou a figurar como fonte constante de desgaste político para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Cobranças públicas, invasões e críticas diretas ao Palácio do Planalto têm exposto a fragilidade da articulação política do Executivo e o impasse em torno da pauta agrária. 

O mais recente capítulo dessa tensão envolve a pressão aberta pela saída do ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira. O MST acusa o titular da pasta de não cumprir promessas relativas a assentamentos e de travar o andamento da reforma agrária. Na avaliação de lideranças do movimento, o governo se perde em anúncios vazios e compromissos não executados, aprofundando a insatisfação no campo.  

Em declarações à imprensa e em manifestações como a ocorrida na Câmara de Vereadores de Votuporanga (SP), a atuação do ministro vem sendo criticada. Teixeira foi chamado de “ministro promessinha” por um coro de militantes que participavam de uma audiência pública em maio. Além disso, lideranças históricas do movimento têm afirmado que o ministro “fala sempre a mesma coisa” e inventa “números que não são reais”.

Um dos líderes do movimento no Rio Grande do Sul, Ildo Pereira afirmou que existe insatisfação diante de uma série de demandas locais, estaduais e até nacionais. “Nós não estamos tão simpáticos a alguns anúncios do governo para a reforma agrária”, disse Pereira à Gazeta do Povo.

Para o líder da oposição, deputado Luciano Zucco (PL-RS), o governo do PT conseguiu a “proeza de transformar um antigo aliado em problema”. “O MST hoje não está satisfeito com pouco, quer mais poder, mais cargos e, agora, quer até escolher o ministro do Desenvolvimento Agrário”, afirmou Zucco. 

Assim, a crise com o MST – antes limitada a críticas da oposição e de setores do agronegócio por causa das invasões – ganha contornos de problema político com ainda mais fôlego. 

A Gazeta do Povo procurou o MST para obter um posicionamento oficial a respeito das queixas relacionadas ao ministro Paulo Teixeira, mas o movimento preferiu não se posicionar.  

O ministro Paulo Teixeira, por sua vez, minimizou as críticas. “Ao contrário de governos anteriores, respeitamos as manifestações. As cobranças fazem parte da dinâmica dos movimentos sociais”, disse o ministro por meio de nota enviada pela assessoria.

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Ministro entra na mira do MST 

O foco atual das tensões é o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, alvo de sucessivas críticas do movimento. Os principais desentendimentos do MST com o ministro estão relacionados ao número de assentamentos e ao ritmo da reforma agrária.

O militante do MST Jaime Amorim disse ao jornal Folha de S. Paulo que o movimento não vê mais sentido em dialogar com o ministro. Para ele, os dados apresentados pelo governo não condizem com a realidade.

“Eles ficam falsificando números, criando uma lógica que qualquer um que conhece um pouco da nossa área sabe que não condiz com a realidade”, afirmou Amorim. “Eu estive em reuniões com o Lula, e ele [Teixeira] fala sempre a mesma coisa […] Parece que a principal qualidade da equipe dele é criar números que não são reais”, salientou o militante na entrevista. 

No primeiro ano de mandato de Lula, o MST manteve uma postura de compreensão, tendo em vista que o governo petista afirmava que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) havia desestruturado as políticas relacionadas à reforma agrária. O movimento teve ainda sinalizações de que o Executivo atenderia às demandas apresentadas. O governo chegou a apresentar o que chamou de “Caderno de Respostas do MST”, como uma espécie de prestação de contas em 2023.

No entanto, desde o final de 2024, as críticas têm se intensificado. Em janeiro, João Pedro Stédile, uma das principais lideranças do MST, chegou a classificar o ministro de incompetente, acusando-o de falhar na disputa por recursos no Orçamento e de não honrar compromissos firmados com o movimento. 

Também no começo deste ano, João Paulo Rodrigues, membro da coordenação nacional do MST, chamou de ridículo o número famílias assentadas, defendendo que o governo estabelecesse a meta de pelo menos 65 mil famílias assentadas até o fim de 2025. A manifestação ocorreu após uma reunião de militantes com o presidente Lula.

Escalada de invasões em 2025 reforça clima de tensão também com a oposição e o agro

O cenário de tensão tem ainda a oposição e o agronegócio como fatores de pressão para o governo. A escalada de invasões do MST evidencia o desafio do governo. 

Até maio de 2025, o país já contabilizava 46 invasões de propriedades rurais, elevando para 171 o número total de invasões desde o início do terceiro mandato de Lula. Os dados são da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

Embora não comente as críticas do MST ao governo, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) tem reforçado sua contrariedade em relação à forma como o governo Lula conduz a reforma agrária, especialmente ao não reprimir invasões.

“Sem segurança jurídica, o agro não consegue ter paz para trabalhar, gerar oportunidade, renda e divisas para o país”, destacou o presidente da FPA, deputado Pedro Lupion (PP-PR) em sua coluna na Gazeta do Povo

Na avaliação do líder da oposição, deputado Luciano Zucco, apesar de já contar com cargos, recursos e investimento, o movimento tem mais ambições. “O pedido de cabeça do ministro Paulo Teixeira é só parte desse jogo de chantagem interna. É disputa por dinheiro, por influência e por aparelhamento do Estado”, disse Zucco à Gazeta

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MST cobra promessas não cumpridas 

De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, desde 2023 para cá, já foram homologados cerca de 38 mil novos lotes para famílias sem terra em todo o Brasil.

Os números do governo, no entanto, não atendem à demanda apresentada pelo MST. No começo de maio, o MST reforçou o pedido de assentamento prioritário de 65 mil famílias que estariam acampadas há mais de 20 anos. Ao todo, o movimento afirma que há 120 mil famílias à espera de terras. Um pedido de R$ 1 bilhão no Orçamento para a reforma agrária também fez parte das reivindicações. A estimativa do movimento é de que, com R$ 100 milhões, em média 4 mil famílias podem ser assentadas.

“Ainda não estamos satisfeitos com a proposta do MDA [Ministério do Desenvolvimento Agrário] sobre o tema da obtenção de terra. O MST está pressionando muito para que o governo se comprometa que ano que vem vá assentar todas as famílias acampadas, são 65 mil”, disse o coordenador nacional do movimento, João Paulo Rodrigues, em matéria publicada em novembro de 2024 na página do MST. 

Em nota à Gazeta do Povo, Teixeira afirmou que as metas de novos lotes de assentamentos estão sendo cumpridas. “O objetivo do governo é entregar 60 mil novos lotes em assentamentos tradicionais até 2026. Para 2025, a meta é de 30 mil novos lotes em assentamentos e até maio, faltando mais da metade do ano, já foram entregues mais de 15 mil lotes. Isso significa que, depois do desmonte realizado pelos governos anteriores, a reforma agrária no Brasil retomou o ritmo dos primeiros governos do presidente Lula”, diz a nota do ministro. 

Ainda assim, integrantes do MST têm feito críticas recorrentes à gestão petista. “Nossa expectativa é que o Lula reassuma o compromisso que ele fez”, disseram Maurício Roman e Lara Rodrigues, dirigentes nacionais do movimento no Rio Grande do Sul, ao Poder360, em 29 de maio. “Não é que a gente está pedindo a cabeça do ministro. O Lula tem total autonomia. Mas todos os acordos que fizemos com ele [Paulo Teixeira] até agora não foram cumpridos”.

Governo Lula tenta amenizar atritos 

Um dos fatores que alimentou o desgaste com o MST foi a ausência do presidente Lula nos assentamentos. O governo, no entanto, tem buscado se reaproximar das lideranças do movimento. No terceiro ano de mandato, diferente dos anos anteriores, Lula retomou as agendas com o MST. No começo de 2025, Lula recebeu militantes no Palácio do Planalto e desde então visitou dois assentamentos, um em Minas Gerais e outro no Paraná.

Na visita mais recente em um assentamento do MST, Lula defendeu o movimento. “A luta do MST não tem nada de ilegal, é para cumprir a Constituição. E é na verdade a história da dignidade do povo, representado pelo MST do Brasil”, disse Lula, em 29 de maio, durante o ato de criação do assentamento Maila Sabrina, localizado no limite entre os municípios de Ortigueira e Faxinal, na região Centro-Sul do Paraná.

Lula enfatizou que ao assumir o terceiro mandato se comprometeu a buscar terras disponíveis para a criação de assentamentos da reforma agrária e evitar o avanço da violência no campo. Ele também se comprometeu a cumprir promessas de campanha assumidas com os movimentos sociais, como a de assentar mais famílias acampadas no país.

“Nós vamos fazer um esforço para entregar o compromisso firmado com o MST. Pois, quanto mais gente tiver produzindo no campo, mais pequenos proprietários, mais incentivo a gente tiver, quanto melhor e mais produzir, melhora a qualidade dos alimentos e fica mais barata para todos”, disse Lula aos militantes. 

O clima de desconforto, no entanto, ocorre mesmo após repetidas declarações públicas de defesa do MST. Ainda em maio, durante a 5ª Feira Nacional da Reforma Agrária, realizada pelo MST, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) havia tentado reforçar a parceria institucional. “Esse é o Brasil que nós queremos, de oportunidade para todos”, afirmou Alckmin, em seu discurso.





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