
Em uma sessão marcada por acordos políticos e interesses setoriais, o Congresso Nacional derrubou nesta terça-feira (17) uma série de vetos presidenciais, com impacto direto na tributação do consumo, nas regras da LDO de 2024 e no setor elétrico. O destaque principal foi a decisão de retirar fundos de investimentos privados e patrimoniais da lista de contribuintes dos novos tributos criados pela reforma tributária — a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).
Após negociações com o governo, os parlamentares rejeitaram os vetos que retiravam a isenção dos Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs) e dos Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas do Agronegócio (Fiagro).
A medida, que reverte o veto parcial do governo à Lei Complementar 214, atende uma demanda do mercado financeiro e de instituições que gerem recursos para causas públicas. Com a mudança, fundos de ações e fundos patrimoniais — como os que destinam lucros a universidades — voltam a ter isenção dos novos impostos sobre consumo.
A derrubada ocorre após meses de controvérsias. Para entidades como a Anbima, o veto original abriria brecha para a cobrança dos tributos, criando desequilíbrio com o investimento direto. O Ministério da Fazenda discordava, mas perdeu. Os trechos retomados agora serão promulgados pelo presidente Lula.
Gasto bilionário e impacto na conta de luz
Outro ponto sensível foi a derrubada de vetos à lei que trata de eólicas offshore. Com isso, parlamentares resgataram benefícios setoriais que podem custar até R$ 197 bilhões até 2050, segundo estimativas da Abrace (Associação dos Grandes Consumidores de Energia). O resultado: mais subsídios na conta de luz do consumidor comum.
Mesmo após ter cedido em parte das negociações, o governo não conseguiu preservar o veto ao trecho mais oneroso — a contratação de usinas a gás com 70% de inflexibilidade, que operam de forma contínua mesmo quando não há demanda. O desfecho representou uma derrota ao Palácio do Planalto.
Ao final da sessão, o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP),disse que o “eventual impacto” na conta de luz será alvo de uma Medida Provisória (MP) a ser apresentada pelo governo federal.
“Eventual impacto nas contas dos brasileiros vai ser objeto de medida provisória que o governo vai editar dentro em pouco e vai encaminhar ao Congresso Nacional para equalizar que não ocorra nenhum tipo de impacto na conta de luz dos brasileiros”, disse Randolfe.
Segurança fora do desconto e fim da Esaf
Nem todos os vetos foram derrubados. Entre os pontos mantidos está a exclusão de serviços de segurança da lista de atividades que teriam direito a um desconto de 60% na nova tributação. Isso atinge, por exemplo, empresas de monitoramento, proteção contra roubo de dados e ressarcimento bancário.
Também foi mantido o veto à recriação da Escola de Administração Fazendária (Esaf), antiga responsável por treinar servidores da Receita e organizar concursos da área.
Vetos derrubados:
Reforma Tributária (Lei Complementar 214):
- Fundos de investimentos privados e patrimoniais voltam à lista de não-contribuintes da CBS/IBS.
Setor elétrico (eólicas offshore):
- Inclusão de “jabutis” que favorecem empresários do setor e elevam subsídios na conta de luz.
Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO 2024):
- Regra para cálculo do Fundo Partidário baseada no IPCA desde 2016.
- Liberação de recursos para obras rodoviárias e hidroviárias estaduais e municipais.
- Autorização para compra de purificadores de água em escolas públicas.
- Ampliação para 36 meses do prazo para cumprir exigências em convênios.
- Dispensa da regularidade fiscal (Cauc) para municípios de até 65 mil habitantes.
- Permissão para realocação de restos a pagar para concluir obras paradas.
- Autorização para licitação com base em orçamentos antigos usando restos a pagar.
Vetos mantidos:
Reforma Tributária:
- Serviços de segurança seguem fora da regra de desconto de 60% na alíquota.
- Rejeição à recriação da Esaf.
- Confirmação da retirada de multa para venda de tabaco em folhas.
- Continuidade da comunicação digital obrigatória com contribuintes.
- Ausência de exigência de estudos de impacto para atualizações de itens médicos e agropecuários com alíquota reduzida.
- Rejeição ao benefício fiscal extra para empresas que importam produtos e não os revendem presencialmente na Zona Franca de Manaus ou Áreas de Livre Comércio.
Adiamento dos vetos
Na sessão do Congresso, também houve um acordo entre oposição e governistas para o adiamento da apreciação dos seguintes vetos:
- 30/22: despacho gratuito de bagagens;
- 9/23: Áreas de Reserva Legal;
- 14/23: Lei Geral do Esporte;
- 18/23: Programa Minha Casa, Minha Vida;
- 46/23 (dispositivos 1, 2, 3 e 6): licitações e contratos administrativos;
- 10/24: incentivo fiscal aos jogos eletrônicos brasileiros independentes;
- 12/24: prazo de avaliação, pelo TCU, do incentivo fiscal para troca de máquinas;
- 14/24 (dispositivos 4 e 5): acumulação de cargos e mandato da ANM;
- 17/24: descaracterização da Política Nacional de Assistência Estudantil;
- 18/24: processo seletivo para Ensino Superior;
- 22/24: regime escolar especial para alunos impossibilitados de ir à escola;
- 23/24: Isenção de IPI em móveis e eletrodoméstico para vítimas de desastres;
- 24/24: Uso do vale-cultura para atividades esportivas;
- 25/24: Prorrogação de financiamentos rurais em municípios em emergência;
- 26/24: Estatuto da Segurança Privada;
- 27/24: Incentivos à indústria de semicondutores;
- 31/24: Regras aplicáveis à VPNI do Senado Federal;
- 32/24: Regras aplicáveis à VPNI da Câmara dos Deputados;
- 37/24: Cadastro Nacional de Pedófilos e Predadores Sexuais;
- 39/24: Revogações de dispositivos na Lei Pelé;
- 46/24: Regras para concessão do BPC e do Bolsa Família;
- 47/24 (dispositivo 2, 5, 7 a 32, 35 a 44, 47 a 164): PLDO 2025;
- 48/24: Autorização para contingenciamento e bloqueio de emendas parlamentares não impositivas;
- 50/24: Créditos de Descarbonização;
- 1/25: Reconhecimento das barracas da Praia do Futuro (CE) como patrimônio cultural;
- 3/25 (dispositivos 1 a 3, 7 a 17, 22 e 23): Marco regulatório de energia “offshore”;
- 4/25: Classificação de diabetes tipo 1 como deficiência;
- 5/25: Programa de Pleno Pagamento de Dívida dos Estados (Propag);
- 7/25 (dispositivos 3 a 9, 14, 15 e 23): Regulamentação da reforma tributária;
- 10/25 (dispositivo 1): PLOA 2025;
- 12/25: Atividades de risco permanente e alterações na proteção de dados.
*Com informações da Agência Senado